Aumento da produção de lixo com o isolamento social, habitat ideal para o animal, pode ter relação com o aumento atípico de vítimas no período frio

Ao lado da mãe Iara, Juan Miguel foi atacado enquanto brincava na garagem de casa; garoto recebeu alta
(Fotos: Wesley Gonçalves)

“Não desejo nada disso para nenhum pai ou mãe. Foi desesperador tirar a blusa dele, ver o escorpião cair no chão e o meu filho passar mal daquele jeito. Viemos rapidamente para o Hospital e graças a Deus ele foi bem atendido. Fica o alerta para que observem tudo ao redor”. O depoimento que resume ao mesmo tempo drama e alívio é de Iara Cristina de Souza Oliveira, moradora do Bairro Major Prates, em Montes Claros.

O filho Juan Miguel de Souza Oliveira, de 9 anos, internado na Pediatria do Hospital Universitário Clemente de Faria (HUCF), é uma das vítimas mais recentes de ataque de escorpiões atendidos pela unidade. O garoto de nove anos brincava na garagem da casa quando foi atacado. Ele já está recuperado e passa bem; recebeu a alta hospitalar.

O Hospital da Unimontes é referência no atendimento de casos que envolvem animais peçonhentos. Conforme o balanço do Escritório de Qualidade do HUCF, nos últimos 45 dias foram 314 casos atendidos (maio e junho). No mesmo período do ano passado, foram 309 atendimentos.

O aumento de vítimas nos últimos dias reacende o alerta sobre a ameaça dos escorpiões, embora o número de casos atendidos nos primeiros cinco meses e meio deste ano ainda seja menor que os dados entre janeiro e a primeira quinzena de junho do ano passado.

NÚMEROS

O escorpião-amarelo é nativo do Norte de Minas e o mais comum nos casos de ataques

O levantamento mais recente do HUCF mostra 1.006 atendimentos de vítimas de ataques de escorpiões entre janeiro e o último dia 14 de junho. A mesma linha de tempo em 2020 teve 1.306 casos. Ou seja, houve uma redução de 29,8% no comparativo com o mesmo período de um ano para outro, mas o aconselhável é justamente reforçar a atenção por causa do aumento de casos nos últimos dias. Maio, por exemplo, detém o recorde de ataques deste ano: 207.

A espécie mais comum Tityus serrulatus (escorpião-amarelo) é nativa do Norte de Minas, o que justificaria tamanha incidência na região, além da inevitável associação com os ambientes favoráveis à proliferação no meio urbano: depósitos de lixos domésticos e de entulhos, rede de esgoto, quintais com entulhos, locais antigos como cemitérios. Outro agravante: o escorpião se reproduz por partenogênese. Isto é, não precisam de machos para gerar filhotes.

“O escorpião passou a ser um problema de saúde pública diante deste histórico de vítimas. No HUCF, eles correspondem a 44,49% do total de ocorrências envolvendo animais peçonhentos nos últimos dois anos”, observa o médico pediatra Carlos Lopo, da equipe do HUCF.

Médico pediatra Carlos Lopo se diz surpreso com grande incidência de ataques no período de temperatura mais amena

O alerta do profissional é ainda maior diante da percepção de mudança de hábito do escorpião e das pessoas, por influência até mesmo da pandemia do Novo Coronavírus. “Estes são animais pecilotérmicos, condição que na qual a temperatura varia de acordo com a do meio. Agora no período frio, os escorpiões não saem com tamanha freqüência, seja para ataques ou mesmo para fazer ninhadas. A justificativa pode ser esta: é um período de isolamento social e houve um grande aumento no consumo de produtos perecíveis e no acúmulo de lixo. Isso atrai moscas e baratas, que são as presas mais comuns para os escorpiões se alimentarem”, afirma Lopo.

DICAS

O pediatra também dá dicas para os pais e responsáveis por crianças e idosos, que são as vítimas menos resistentes aos efeitos do veneno destes animais. “Quanto mais frágil a pessoa atacada, maior é o risco de morte. Por isso, entendendo que acidentes com escorpiões podem ser minimizados com cuidados permanentes e diários: sacudir sapatos, verificar as toalhas e roupas antes de vestir, camas arrumadas e estendidas e afastadas das paredes. Estes cuidados básicos ajudam a diminuir a produção de ácaros e insetos, pois os escorpiões conseguem subir em paredes e podem estar escondidos entre as roupas”, acrescenta Carlos Lopo.

NÚMEROS

Ataques de escorpiões atendidos pelo Hospital da Unimontes, de janeiro à primeira quinzena de junho:

2021
Total: 1006
Mensais: janeiro (166), fevereiro (187), março (176), abril (163), maio (207) e junho (107).

2020
Total: 1.306
Mensais: janeiro (266), fevereiro (291), março (237), abril (203), maio (187) e junho (122)

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