Muita gente não sabe, mas Montes Claros teve um papel crucial no processo de implementação do Sistema Único de Saúde (SUS). E o curso de Medicina da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimotnes) faz parte dessa história. A importância e atuação dos principais envolvidos nesse processo foram discutidas e resgatadas no 1º Seminário História e Saúde: contribuições do Projeto Montes Claros para Implantação do SUS no Brasil”, realizado nesta quarta-feira (27/11).
Iniciativa da coordenação do curso de Serviço Social, o evento aconteceu no auditório do Centro de Ciências Humanas (CCH), prédio 2 do campus-sede, tendo como destaque as presenças de pioneiros do projeto piloto que deu origem ao SUS.
Coordenado pelas professoras Leni Silva e Filomena Luciene Cordeiro Reis, com o o apoio dos acadêmicos (do primeiro e quarto períodos) do curso de Serviço Social, o seminário teve como objetivo promover uma reflexão aprofundada sobre o impacto histórico e político do Projeto Montes Claros na construção do SUS, uma das maiores conquistas sociais do país, no contexto da saúde pública brasileira.
A solenidade de abertura foi presidida pelo reitor da Unimontes, professor Wagner de Paulo Santiago. Ao cumprimentar os os professores e alunos pelo evento, ele anunciou a proposta da Universidade de elaborar e publicar um livro sobre o projeto que foi nascedouro do SUS com a participação dos pioneiros da iniciativa histórica na saúde pública brasileira.
O professor Wagner de Paulo Santiago se emocionou ao citar o nome dos dois professores aposentados da Faculdade de Medicina (Famed) que atuaram diretamente no Projeto Montes Claros e que marcaram presença no seminário: João Batista Silvério e Itagiba de Castro Filho, ambos pediatras. A Famed foi uma das unidades da antiga Fundação Norte Mineira de Ensino Superior (FUNM), atual Unimontes.
Os médicos se juntaram ao projeto do missionário norte-americano Leslie Scofield, que realizou um profundo diagnóstico das condições de saúde materno-infantil da população ribeirinha do São Francisco. Scofield desenvolveu uma proposta de atenção primária em sua tese apresentada na Universidade de Tulane.
O Projeto Montes Claros após articulação universidade por meio do Instituto de Preparo e Pesquisa para o desenvolvimento Assistência Sanitária Rural (Ipedasar), foi implantado na Regional Norte de Minas, como piloto. A experiência se transformou na “Carta Montes Claros”, lida pelos alunos durante o Seminário, instrumento político fundamental da conversão do velho modelo do INAMPS na arrojada proposta do então Sistema Unificado de Saúde (SUS).
O professor aposentado Itagiba de Castro, membro da Academia Mineira de Medicina, destacou a importância do papel da Unimontes na produção do conhecimento por meio das pessoas de referência da história do SUS. “A história tem que ser registrada. Fico muito feliz de contar a versão de quem realmente trabalhou, aqueles que fizeram parte da história do SUS e da FUNM/Unimontes”, afirmou.
Além de docente da disciplina “Formação sócio-histórica do Brasil” do curso de Serviço Social, a professora Filomena Cordeiro é responsável pela Diretoria de Documentação e Informação (DDI). O setor guarda arquivos e documentos de toda a história de criação do SUS, disponíveis para consulta.
“Na disciplina a gente trata da história do Brasil colônia até a República, repensando nesse processo, quem somos nós, povo brasileiro, qual é o nosso lugar e pensar que tudo foi articulado aqui, na universidade. As pessoas que participaram do projeto foram nossos professores. Isso é muito representativo. Quem quiser, pode comprovar tudo no DDI”, assegurou a professora Filomena Cordeiro. Ela explicou as contribuições da iniciativa para o desenvolvimento econômico da região, analisando a relação entre saúde e o desenvolvimento local.
Ainda dentro da programação, foi prevista para as 19 horas desta quarta-feira palestra do ex-Ministro da Saúde José Saraiva Felipe, que também atuou na iniciativa pioneira, abordando como o Projeto Montes Claros provocou transformações políticas e sociais do Brasil.
Confira trechos das diretrizes para a Política Nacional de Saúde propostas na Carta Montes Claros:
A política de saúde deverá estar orientada pelo princípio de que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado. Deve ser objetivo de curto prazo alcançar a universalização do acesso às ações de saúde.
O setor público deve ser considerado como parte indispensável ao cumprimento deste objetivo, tendo o setor privado uma atuação complementar. Desta forma, as ações de saúde devem ser consideradas como um serviço de interesse público. As relações entre Estado e setor privado deverão se orientar pelo princípio da concessão de um serviço público.
Deverá ser implementada, de imediato, uma reformulação do setor saúde, transferindo-se para o âmbito do Ministério da Saúde: o INAMPS, a Central de Medicamentos (CEME), o setor de saúde ocupacional e a formulação da política de saneamento básico, bem como o repasse de recursos financeiros respectivos.
A transferência do INAMPS para o Ministério da Saúde, por si só, não resolve todos os problemas. Ela deverá vir acompanhada de modificações em sua estrutura, que eliminem as práticas distorcidas de clientelismo e de fraudes; para tanto, deverão ser propostos mecanismos de participação dos trabalhadores, empregadores, profissionais de saúde, do Executivo e do Legislativo na definição, implementação, fiscalização e acompanhamento das políticas, planos e programas.