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Professora aborda gênero e poder no Brasil em universidade portuguesa

By DTI

November 12, 2013

A professora Cláudia Maia, da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), proferiu a conferência “Gênero e poder no Brasil: a construção social da solteirona no início do século XX”, na Universidade Nova, de Lisboa (Portugal), nessa segunda-feira (11/11). O tema faz parte de sua tese de doutorado, que resultou no livro “A Invenção da Solteirona”, publicado com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).

Docente do departamento de História e dos programas de mestrado em História e Letras/Estudos Literários – e também líder do Grupo de Pesquisa, Gênero e Violência da Unimontes –, a professora Cláudia de Jesus Maia é doutora em História pela UnB, com área de concentração em “Estudos Feministas e de gênero” e com período de intercâmbio (sanduíche) na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), em Paris.

Atualmente, ela cursa pós-doutorado na Universidade Nova de Lisboa, com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/MEC). Também atua como professora-colaboradora do mestrado de Estudos sobre as Mulheres e o Gênero da mesma instituição.

Três anos de pesquisa

Conforme explica Cláudia Maia, para concluir a tese de doutorado que resultou no livro “A invenção da Solteirona”, durante três anos, ela desenvolveu pesquisa que analisou a construção do estereótipo da solteirona em Minas Gerais, entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, “mostrando como este estereótipo foi usado como uma espécie de terror moral para coagir as mulheres a se casarem”.

Nesse período, informa a pesquisadora, especialmente a partir de 1917, com a implantação do primeiro código civil brasileiro, as mulheres casadas eram legalmente incapazes, não podiam administrar bens, constituírem-se indivíduos jurídicos ou trabalhar sem autorização do marido. Por isso, observa, “muitas mulheres que queriam ser mais independentes e seguir uma carreira profissional preferiam ficar solteiras”.

A professora da Unimontes revela que consultou vários arquivos em Minas Gerais: Belo Horizonte, Diamantina, Juiz de Fora, Mariana e Barbacena, além de Montes Claros. “Utilizei vários tipos de fontes que vão da literatura, a jornais, testamentos e teses de Medicina, pois analisei como os diversos discursos – médico, jurídico, jornalístico, literário – construíram o estereótipo da solteirona como uma mulher amarga, infeliz e invejosa”, relata.

A linguagem do livro

Conforme Claudia Maia, o livro “A Invenção da Solteirona” apresenta uma visão da melhor solteira no Brasil. “Procurando aliar a epistemologia feminista e a proposta de uma história genealógica formulada por Michel Foucault, o livro busca compreender a invenção discursiva da solteirona no Brasil e os aparatos que acompanharam essa invenção, tais como o casamento, a sexualidade reprodutiva e a família conjugal, percebidos como estratégias importantes do Estado para disseminar o controle e a disciplina na vida cotidiana, sobretudo das mulheres”, descreve a autora.

Ela ressalta que procurou entender “porque mulheres que experimentaram formas de vida solitária, vivendo e morrendo solteiras, sem qualquer tipo de vínculo conjugal ou de prática sexual socialmente reconhecida, não encontraram representação positiva de sua experiência”. Diante disso, demonstra a constituição e funcionamento de práticas discursivas – como a médico-científica, jurídica, literária e jornalística – que, por um lado, instaurou a idéia do casamento como destino e vocação inata das mulheres, único caminho para a felicidade e realização feminina; e, por outro, procurou suprimir outras formas de vida, como as de pessoas celibatárias.

Assim, observa a autora, “nasce a solteirona como um sujeito marginal e outrificado; uma mulher invejosa, frustrada, infeliz e desencantada, por oposição a esposa-mãe feliz e sexualmente satisfeita. Se, em outros contextos históricos, “solteira” era apenas um status jurídico ou uma condição de desprestígio social, com o discurso científico-moral – sobretudo, do segundo quartel do século XIX e primeira metade do XX – “solteirona” passou a ser um desvio da natureza, uma anomalia social, um ser desprezível e risível, a figura da diferença. A campanha de “terror moral” levada adiante através do estereótipo da solteirona visava, portanto, coagir as mulheres ao casamento legalmente constituído onde seu trabalho, seus bens, sua autonomia e sua vida eram mais facilmente controlados”.